Um
africano nascido no Brasil. Foi a partir dessa constatação que o
arte-educador e coordenador de projetos culturais Don Perna – como faz
questão de ser identificado – deu início à sua trajetória enquanto
membro do movimento negro do Pará. Indignado com os desafios que ainda
afligem a comunidade negra em todo o mundo, Don decidiu criar voz. “A
gente que nasce na periferia, que tem uma pai alcoólatra e que a mãe
precisa trabalhar o dia inteiro é educado pela rua”, lembra. “Assim como
eu vi muita coisa errada, também descobri que minha mãe não era morena
e, sim, negra. Esse foi o estímulo que tive para descobrir quem sou e a
minha busca por identidade”.
A partir do movimento, hoje,
interligado, ele vê avanços quanto à garantia de direitos. “Existe um
sistema de resistência global que identifica que os mesmos desafios são
enfrentados por todo negro em qualquer lugar do mundo. O movimento tem
crescido e deixado de ser isolado”, acredita. “As cotas são
significativas e importantes para o movimento. É uma medida paliativa,
mas que consegue pautar nossos problemas e fazer refletir sobre as
dificuldades que enfrentamos”.
Apesar dos avanços, porém, para ele, a
sociedade está longe de conquistar a igualdade. “O movimento ainda não
chegou onde se quer.
Ainda estamos longe de não termos
mais que discutir o racismo no Brasil. Houve um grande sequestro (quando
os negros foram trazidos da África para o Brasil) e ele tem sequelas
que duram até hoje”, destaca. “O mundo está doente e o racismo faz parte
dessa doença”.
Coordenadora do Núcleo de Estudos
Afrobrasileitos (Neab), a professora Helena Rocha também não nega que a
Lei de Cotas – publicada pelo Governo Federal no Diário Oficial da União
em outubro deste ano – é o reconhecimento, por parte do Brasil, de sua
dívida com a população negra decorrente do longo processo de escravidão
que o país passou. Ainda assim, ela acredita que, para além do acesso,
outras garantias são necessárias para diminuir as graves consequências
sociais que a escravidão causou à parcela da população, que em
determinado momento no Império, foi impedida por lei de sentar nos
bancos escolares. “O acesso à educação superior já está garantido
através da Lei de Cotas”, destaca. “O grande problema está na
permanência desse aluno para efetivar seu sucesso, o que se daria
através de bolsas de permanência em estudo pelo atual governo”.
Para ela, quando o assunto é educação,
os desafios também precisam ultrapassar as barreiras do ensino
superior. “O maior deles [desafio] é estar em uma escola em que o aluno
não vê suas raízes africanas ou quando as vê na aula e nos livros
didáticos ela está encharcada de aspectos negativos da África como fome,
miséria, Aids, guerras. Por isso é necessário investir na formação
inicial e continuada dos professores que atuam na educação Básica”,
acredita. “Quanto à educação básica o grande engate é o ensino médio e
que, como é obrigatória a oferta e o acesso através da LDB 9394/1996, as
políticas deveriam estar voltadas para a permanência desse aluno e seu
sucesso escolar”.
MUDANÇAS
MUDANÇAS
Para a antropóloga e professora de
diversidade étnico racial Marilu Campelo, muitas são as mudanças de
pensamento que precisam acontecer para que se construa uma sociedade
mais igual para as pessoas negras. “A sociedade brasileira é
extremamente racista. Por isso, o significado maior é o da mudança de
pensamento”, afirma. “É necessário que haja uma mudança estrutural. É
preciso reconhecer que essa população faz parte da história
civilizatória do nosso país”.
De acordo com a professora, algumas
mudanças são mais urgentes como a necessidade de entendimento que a
população negra foi parte fundamental na construção da sociedade atual.
“Muitos de nossos modos de viver e falar vem deles (negros)”, destaca.
“As cotas são extremamente relevantes. Em uma sociedade estruturalmente
preconceituosa, é preciso uma ação estruturativa para acelerar o
processo”.
(Diário do Pará)
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